No final dos anos 90 e início da década de 2000 diversos pesquisadores da área de comunicação criaram o conceito do “coronelismo eletrônico”. A grande sacada foi justamente o de explicar um fenômeno bastante particular: a utilização política de emissoras de rádio e televisão por grupos familiares das elites políticas nas esferas regionais e municipais.
Que estudou ou leu sobre a história brasileira sabe que o “coronelismo” foi uma forma específica de identificação do poder privado a partir de compromissos (promessas) e na troca de proveitos com o poder público. Os coronéis e líderes de oligarquias regionais tiravam proveito do poder público (governadores, prefeitos/intendentes e presidentes) nos séculos IXX e XX.
Hoje essa prática é associada aos chamados impérios (sistemas) de comunicação que são mantidos por chefes políticos oligárquicos. Poderíamos citar dezenas, mas vamos lembrar apenas um, o atual presidente do Congresso Nacional, José Sarney, que no Maranhão tem emissoras de rádio, televisão e jornais.
Esse tipo de gente é quem pauta a imprensa que divulga as notícias de acordo com as conveniências políticas, principalmente, e comerciais. O erro existe deste a falta de ética até o processo de concessão de emissoras de rádio e televisão. Israel Bayma, engenheiro eletrônico e com forte militância política e social disse certa vez: “O compadrio, a patronagem, o clientelismo, e o patrimonialismo ganharam, no Brasil, a companhia dos mais sofisticados meios de extensão do poder da fala até então inventados pelo homem: o rádio e a televisão”.
Em Juazeiro do Norte não encontramos uma realidade muito diferente da esfera nacional. As emissoras de rádio, sem exceção, posam de independentes, quando na realidade não o são. Prova maior é que as que não ligadas a um político detentor de mandato ou não, são a instituições religiosas, esquecendo o preceito constitucional que antes de ser de fulano ou beltrano, a concessão é pública.
Assim é que a linha editorial de cada uma é de acordo com o que quer o político ou seu parente/imediato. Sem receios vamos ser claros e lembrar que a Rádio Tempo é do senador Eunício Oliveira (PMDB), a Vale FM do atual prefeito Raimundo Macedo (PMDB), A Verde Vale AM e a TV Verde Vale do deputado Manoel Salviano (PSD), a Juazeiro FM do deputado José Arnon (PTB) e a Progresso AM do Coronel Adauto Bezerra. Sobram a Padre Cícero FM e a Iracema AM. A primeira é educativa e faz parte da Ordem Salesiana enquanto a segunda é do empresário Figueiredo Correia, mas está arrendada a Igreja Universal do Reino de Deus, entendam Rede Aleluia. A TV Verdes Mares Cariri como o próprio nome diz é do mais sólido grupo de comunicação do Estado.
Lembremos que neste leque de emissoras há as educativas e comerciais. Qual é mesmo o programa de cunho educativo existente em Juazeiro? Lembro que a Juazeiro FM não tem programação jornalística e desafio um ouvinte a pedir e ouvir uma música gospel na Padre Cícero FM ou uma da renovação carismática na Iracema.
A nítida impressão que se tem é que os ótimos e bons profissionais de rádio, os comunicadores ficam reféns dos interesses político/editoriais. Os profissionais são considerados importantes enquanto rezam na cartilha do coronel, digo, do dono da emissora. Não é de hoje que se sabe o entra e sai de profissionais em emissoras de rádio ocasionadas, mesmo que não admitido pelas partes, em função da praga da política.
Recordemos alguns casos não muito distantes. Em 2010 João Hilário saiu da Tempo FM e acabou optando pela Padre Cícero FM onde, aparentemente, encontrou mais independência no horário. O motivo teria sido o fato de em Barbalha, onde é líder político, apoiar Camilo Santana (PT) apara Assembléia Legislativa em detrimento do jovem Daniel Oliveira (PMDB) sobrinho de Eunício Oliveira. No mesmo período Hilário esteve afastado do Jornal Verde Vale Notícias da TV Verde Vale de Manoel Salviano (na época do PSDB) porque estava apoiando o então candidato Raimundo Macedo (PMDB) também em Barbalha.
Ronaldo Costa tinha programa na Verde Vale AM junto com o também radialista Jota Luiz e em função de um comentário político do primeiro, acabaram saindo da emissora e foram absorvidos pela Tempo FM dentro da equipe então comandada por Francisco Fabiano (Jornal da Tempo e SuperTempo). A Verde Vale AM também afastou de seus quadros, em 2008 o jornalista Francisco Demontier Tenório que não teria seguido a cartilha do então candidato Salviano.
Em outubro do ano passado a radialista Silene Santos foi dispensada na Vale FM. Segundo ela o motivo alegado foi o fato de ter votado no candidato Manoel Santana (PT) e não no seu patrão e dono da emissora, Raimundo Macedo. Rola processo da ex-funcionária contra a emissora. O radialista Jucimar Leite também foi dispensado pela Vale FM, só que agora em janeiro e numa rede social associou a questões políticas. Ele está de volta a Verde Vale AM onde já tinha uma exitosa passagem e teria saído em 2008 também por questões política.
Ano passado o apresentador Wilson Melo da TV Verde Vale acabou saindo porque não concordou com a linha editorial adotada na emissora que criticou durante três anos e meio a administração petista local e mudou em função do apoio do proprietário Salviano ao projeto de reeleição de Santana.
Por fim, para não ficar cansativo, um episódio mais recente. O bom Lucion Oliveira e toda sua equipe foram sacados do Jornal SuperTempo mesmo havendo um contrato apalavrado com a direção da emissora que valia de outubro de 2012 a outubro de 2013. Como não estava assinado, repito apenas apalavrado, a direção arrendou para outro grupo que hoje tem como apresentador Wilson Melo. O motivo pode ter sido maior valor financeiro ou preferência técnica, contudo a exemplo de outros casos citados uma falta de respeito para com os profissionais e, principalmente, para com o ouvinte. A boca miúda comenta-se que a direção da rádio segue determinação de Eunício que por sua vez atende pedido de Raimundo Macedo.
Repararam que as vítimas da vontade das emissoras são sempre os profissionais? É como se houvesse uma manipulação e o descartado aqui é pego como ponto forte ali. Até quando teremos essa realidade? Os coronéis eletrônicos parecem não entender que contratados ou não da emissora (horários arrendados) os profissionais de comunicação têm o dever em cumprir seu horário e trabalhar de acordo com as exigências da legislação e não com a vontade política de um proprietário ou diretor.
Verificamos que as emissoras de rádio de Juazeiro ou são de ex-prefeitos, do prefeito em exercício ou de alguém que deseja ser prefeito. Até no processo eleitoral a situação se complica com emissoras transformando-se num verdadeiro palanque eletrônico. Alguém recorda em passado recente o combatido rádiojornalismo da Vale FM? Como está agora e como estará em seis meses ou um ano sendo uma espécie de estatal do executivo Municipal visto que o seu âncora é também o assessor de comunicação? Por favor, entendam, não há nenhuma crítica ao profissional, mas ao sistema.
Bom seria se processos de concessões de emissoras de rádio e televisão fossem revistos. As emissoras de TV recebem a concessão por 15 anos e as de rádio, por 10 anos, e durante todo esse período os detentores destas concessões não têm que prestar contas a ninguém sobre o uso que fazem delas. Isso é um absurdo. Embora a concessão seja pública no Brasil o sistema de comunicação é concentrado num verdadeiro atentado a democracia.
Não me surpreenderei se não for compreendido por alguém com minhas palavras afinal é mais prático fazer de contas que o que estou afirmando não é a realidade dos fatos do que ter a coragem, determinação e independência de curtir ou compartilhar numa rede social e dizer que é assim mesmo que o sistema funciona.
Viva os profissionais sérios da comunicação. Viva aos radialistas e jornalistas. Da mesma forma que presto minha solidariedade repudio os coronéis eletrônicos de Juazeiro que pensam querer transformar os comunicadores em marionetes.
Por: Beto Fernandes
Por: Beto Fernandes
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