O que fazer quando as melhores escolas ensinam que Galileu foi condenado pela inquisição? O que dizer quando pais se dão por satisfeitos quando seus pupilos leem Harry Potter? O que pensar do futuro quando diretores e coordenadores de escolas acham que preencher diários é mais importante que uma boa aula? O que dizer quando capacitações para professores são ministradas em todo o nordeste e, quiçá, o Brasil, baseadas em referencias como Piaget, Wallon e Vygotsky? Ou pior, quando secretarias de “cultura” de todo país resumem suas políticas culturais pelo viés economicista de valor de troca (ações políticas dependentes de retorno eleitoral)?
Querer construir algo em cima de uma base tão movediça não é só sinônimo de utopia, mas, sobretudo de uma doença psicológica qualquer que eu nem arriscaria um palpite. Paranoia? Psicose? Não sei. O que sabemos é que sustentar tais utopias custam tempo e dinheiro. Tempo e dinheiro que um país de quinto mundo (ou em desenvolvimento, como preferem os mais otimistas) não poderia sonhar em desperdiçar. A montanha de dinheiro que os governos têm gastado sustentando todo tipo de ações ilícitas, licitações fraudulentas, superfaturamento, além de financiamentos a projetos de pessoas sem o menor compromisso com o povo tem modificado a o DNA do brasileiro.
As ações acima exemplificadas já, de muito longe, preencheu a mente do brasileiro a tal ponto que as mesmas se transformaram em ações por reflexo condicionado, assim como os cães de Pavlov. Reivindicando o mesmo direito de desonestidade a população passa por uma crise moral “nunca vista antes neste país”. O direito ao roubo, a corrupção, a desonestidade, a mentira, ao conformismo, faz parte hoje da educação de todo o país. As crianças vão à escola para aprenderem a ser dar bem na vida, sonhar com um “futuro melhor” (leia-se ganhar dinheiro). O estreitamento do horizonte reduzido pela perspectiva de uma educação economicista tem castrado qualquer possibilidade de uma verdadeira educação. Deste modo, com as “portas abertas”, temos aqui o rompimento de seis grandes eixos de sustentação da cultura ocidental onde o filósofo Mário Ferreira dos Santos classificou: a) O universo é criatura, inclusive o homem; b) Os povos irmanizam-se pela mesma fé, e todos são iguais perante Deus; c) A divindade é providencial; ou seja, providência (tem uma vidência pro, vê, dispõe com antecedência o que pode acontecer, o possível histórico); d) O homem é um ser inteligente e livre, que pecou livremente; e) Contudo, pode salvar-se, graças a um mediador (Cristo), e pela livre escolha da salvação, ou por uma graça divina (gratuita ou não); f) A paz reinará quando a boa vontade dominar entre os homens, a vontade sadia, liberta dos vícios, que a condenam ao erro.
O mero rompimento de uma das ações acima que estão interligadas prova a dissolução da unidade que mantem nossa civilização. Não precisa dizer que há muito tempo já não temos tal unidade e isso se reflete de modo claro no atual estado de coisas onde se seguem como feridas vivas em nosso meio. Elas se especializam e tomam vida por meio de que já bem conhecemos: a)Em primeiro lugar pela exaltação da força – Estimula-se a acentuada valorização dos homens que se revelam possuidores de grande força, mesmo que seja apenas da força bruta. Compara-se com orgulho a semelhança dessa força, alegando-se a grandeza do homem que a possui. Não importa que seja um débil mental, mas se é capaz de bater recordes, e de dobrar uma barra de ferro, ou de dar um murro igual ao coice de uma mula, estamos, então, em face de um espécime humano de alta valia; b)Supervalorização da força – O homem de músculos de aço já não é um exemplar curioso, é o herói popular, algo que representa um idealtypus das multidões bárbaras; c)Valorização acentuada da agilidade e da capacidade meramente física – Como maneira bárbara mais elevada de apreciação dos valores humanos está a valorização acentuada da agilidade, das habilidades físicas; d)Valorização exagerada do corpo em detrimento da mente – Este é um dos aspectos mais graves do barbarismo vertical. “Mente sã num corpo são” é uma máxima culta. Nunca, porém, considera um homem culto que mais vale corpo são que mente sã, nem que baste apenas um corpo são; e)Valorização do visual sobre o auditivo – (...)É mais fácil ver, contemplar, do que ouvir com atenção. O que se ouve com atenção guarda-se mais facilmente na memória, e a voz interior é mais lógica e mais segura que as imagens visuais soltas da fantasia. O ouvido, em geral, não fantasia, mas a visão, sim. O barbarismo vertical processa uma supervalorização do visual, de modo que os espetáculos são mais organizados para os olhos do que para os ouvidos; f) Acentuada supervalorização romântica da intuição, da sensibilidade e da sem-razão. Há uma exagerada valorização romântica sobre a sensibilidade, a sensação, os sentimentos comuns, a intuição sensível, a fantasia, e a sem-razão, e os estragos que o romantismo realizou, não só no filosofar, como em todas as outras manifestações superiores do homem, que foram deploráveis, e cujos frutos ácidos colhemos agora. É que as teses românticas não são criadas num determinado período histórico, como o foi o nosso de fins do século 18 até os dias atuais, em que se processou o movimento romântico, não só na arte, na filosofia, como até nas atitudes éticas e morais do homens, incluindo a política, a economia, etc.
Observando a descrição exata do filósofo contida em seu livro “A invasão vertical dos bárbaros”, que jamais nenhuma secretaria de cultura se ocupou de ler, estudar, refletir ou tampouco ofertá-lo a um publico que pudesse vir a ser formado, é de estarrecer. Não é, portanto aqui, uma visão pessimista em ver que as receitas requeridas por muitos para minimizar a situação da cultura brasileira é na realidade um veneno mais letal do que deixar o moribundo na calçada. O mero financiamento não trará retorno a uma cultura se sua verdadeira base cultural for restaurada e em muitos aspectos construída do zero. Há hoje um dia um otimismo infantil ao acho que os recentes gastos em “pontos de cultura”, em valorização das culturas negras e indígenas, por exemplo, possa nos erguer a um patamar tolerável. O que obtemos com isto é nada mais do que já temos: um adesivo na testa classificando-nos como politicamente corretos e nada mais.
Enquanto uma revisão drástica não for feita em toda educação brasileira, a cultura permanecerá agonizando, com suas ações promovidas por ministérios e secretarias, gastando o dinheiro do povo sem nenhuma chance de retorno. No entanto haveremos de permanecer assim, em dia com as burocracias das secretarias de cultura e educação e das escolas privadas com seus diários preenchidos... Mas onde a educação e a cultura verdadeira não passam de uma utopia burocrática.
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