Sunday, September 30, 2012

Histórias e Estórias do Crato de Antigamente - Por: Ivens Mourão




Crato em 1925

MIRINDIBA
O Júlio Saraiva era também uma espécie de Burle Marx da cidade. Era ele quem projetava os jardins públicos e orientava a sua implantação. Sempre utilizava as árvores da região, para possibilitar sombreamentos. Mas nunca chegou a utilizar uma conhecida por “mirindiba”, bastante apreciada como alimentação dos veados (o animal mesmo). Dentre as árvores da Siqueira Campos tinha umas palmeiras imperiais que já estavam necessitando de substituição.
Por ser um espaço muito democrático, no qual se reuniam os mais distintos grupos de pessoas, também contava com representantes do que hoje chamaríamos “gays”. O local de suas reuniões era, justamente, embaixo das tais palmeiras.
Certo dia o Padre Gomes, passando por lá, na sua costumeira conversa com o Júlio Saraiva, sugeriu:
- “Júlio, por que você não substitui estas palmeiras que estão morrendo por “mirindiba”. Os veados da praça vão gostar!!!”
Em primeiro plano a Praça Siqueira Campos e as palmeiras, sob as quais se reuniam os “gays”. Ao fundo o Grande Hotel e, no térreo, a Sorveteria Glória.

FRESCURA
Júlio Saraiva era freqüentador assíduo da Praça Siqueira Campos. À noite a sua presença era sagrada. Durante o dia, naquelas horas em que o calor era mais intenso, ia sempre à Sorveteria Glória tomar um refrigerante ou algo gelado, que abrandasse o calor.
O Veridiano, meu primo, que hoje mora em Teresina, trabalhou certo período na Sorveteria do Luís. Costumava atender ao Júlio. Um dia, porém, ficou confuso com um seu pedido, ao pé do balcão:
- “Me dá uma frescura, aí.
- Oxente, “seu” Júlio, uma frescura?
- Sim, uma frescura!
- Não estou entendendo. O senhor quer um refresco?
- Não, refresco é fresco duas vezes. Eu só quero uma frescura.


AROEIRA
O Sr. José Horácio Pequeno era Prefeito do Crato, tendo como Secretário de Obras, o Júlio Saraiva. Nessa época a Chesf começou a instalar a rede elétrica, que possibilitaria à cidade receber, finalmente, os benefícios tão longamente esperados da energia gerada na cachoeira de Paulo Afonso.
O Prefeito convocou o seu Secretário de Obras e determinou que providenciasse a retirada de toda a rede elétrica pública, incluindo postes e fiações, pois a Chesf iniciaria a instalação da nova rede.
E assim foi feito. O Júlio estava supervisionando a retirada de um poste (eram todos de madeira), e ficou admirado ao perceber que o trecho que estava enterrado há muitos anos encontrava-se em perfeitas condições. Até as marcas do machado que beneficiara aquela madeira estavam intactas. Diante da sua admiração, o operário explicou:
- Ah, “seu” Júlio! Isto aqui é aroeira. É o miolo da aroeira. Não acaba nunca. É mesmo que ferro!
- Ah, com os diabos! Agora eu descobri uma coisa!
- O que foi, “seu” Júlio?
- A mulher lá em casa é feita de miolo de aroeira...

POVO “BÃO”, UAI!
Chico Soares fazia parte dos freqüentadores assíduos da Praça. Depois de um período em Belo Horizonte, passou a participar dos jogos de buraco, na casa do Luís, que aproveitou para perguntar como tinha sido a sua experiência em Belo Horizonte. E o Luís ficou na dúvida se ele estava brincando ou falando a verdade. Contou o seguinte:
- “Ah! Fui muito bem, Luisinho. Povo muito bom!! Você sabe que eu já estava gostando! Já estava até falando ‘Belzonte’, ‘Trem Bão’, ‘Uai’. Olha esses óculos. Não são bons? Pergunta quanto custou.”
- “Não tenho a menor idéia”.
- “Não custou nada! No tempo em que morei lá, comprei fiado em tudo quanto era loja e não paguei a ninguém. Que povo acolhedor!!!”

O FESTIVAL

Na década de sessenta eram comuns os festivais de canção popular. O Crato, guardadas as devidas proporções, também organizou os seus festivais. Realizavam-se na quadra de esportes, próxima ao Hospital São Francisco.
Nesta mesma época o Chico Soares resolveu fazer um empréstimo no Banco. O Gerente foi taxativo:
- “Para você eu não empresto. A não ser que tenha um avalista bom, eu empresto”.
- “Serve o Brigadeiro?”.
O gerente aceitou na hora e já preparou a letra para colher as assinaturas. O Brigadeiro era rico e dono de um grande patrimônio.
Lá se foi o Chico dar a “facada” no amigo. E o Brigadeiro:
- “Chico, eu não sei não. E esse Gerente te empresta?”
- “Com o seu aval ele empresta até o Banco todo!” ·
O Brigadeiro, coçando a cabeça, pensou: “Será que esse ‘fio duma égua’ vai pagar? Mas ele é meu amigo! Amigo é para ajudar aos outros. Eu vou arriscar”. E falou:
- “Me dá essa letra que eu assino!”Chegou a data do vencimento e nada de pagamento. O Brigadeiro recebeu a primeira cobrança do Banco, mas pensou: “Vou dar mais uns dias. Ele deve pagar. Não vai fazer uma desfeita dessa com o amigo”Diante da segunda cobrança, o Brigadeiro resolveu ir à Repartição, onde o Chico trabalhava. E numa sala bem comprida a sua mesa ficava lá nos fundos. O Brigadeiro, logo da porta, segurou a letra com as duas mãos, levantou-a bem alto e falou:
- “Chico, Chico é a letra que você não pagou e eu fui pagar lá no Banco. E aí?”O Chico, com a cara mais lisa do mundo:
- “E ai? Ora Brigadeiro não é uma letra? Bota uma música nela que é capaz de você ganhar o festival de música, lá na quadra!!!”

Por: Ivens Mourão 
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