Monday, November 30, 2009

Tributo ao rabequista José Oliveira - Carlos Pontes


A cegueira mais intensa e pecaminosa não é exatamente a que tinha o virtuoso rabequeiro José Oliveira. Muito pelo contrário, suas harmonias vinham dos anjos e de outras místicas que não atingimos. Cegueira grave mesmo é a dos 77 milhões de brasileiros não-leitores (e dentre esses 22 milhões que são analfabetos), vítimas de uma alienação terrível que assola este país. Ou mesmo de programas de auditório cheios, mas vazios de conteúdo, de políticos inescrupulosos que insistem ofuscar nossos valores a qualquer custo. Ou mesmo a custo nenhum. Lembrar que o nordestino não tem serventia nos tempos atuais apenas para mão-de-obra lá no sudeste ou sul. Nós pensamos. Embora muitos não admitam. A inocência de José Oliveira advém dos céus. Isso é um fato. Sua história é bonita. É de uma herança medieval. A cegueira alienante da sociedade é que não consegue enxergar. Que pena. Estamos empobrecendo culturalmente. Isso é grave. Precisamos de violas, rabecas, sanfonas, ganzás e outras tantas manifestações que imitem a fala nordestina. A fala de nossa alma. Não podemos nos empolgar tanto com a especulação imobiliária. Senão vamos ficar igualzinho a milhares de cidades, com as mesmas ânsias, fobias, temores. José Oliveira é um profeta do seu tempo. De bom ou ruim. É um divisor das águas do que desejamos (será que ainda desejamos?) a uma ciência que batizamos de cultura. Ou quem sabe não desejamos p... nenhuma. E que José Oliveira possa inspirar nossas almas vazias, precárias e voluntariosas. Que os versos e harmonias não sejam saberes de tempos pretéritos, apenas. E principalmente que o ser humano seja um projeto que dê certo e possa enxergar melhor.

Carlos Pontes
Editor da Revista Mambembe

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