Friday, November 27, 2009

PROSOPAGNOSIA - Por: Vicente Almeida

imaginou como é difícil viver sem reconhecer o rosto de alguém, e às vezes não identificar nem mesmo o seu rosto?

SE perguntar a uma pessoa normal como ela reconhece um rosto, provavelmente ouvirá ela dizer: “olhando para ele, é claro!”

MAS, há pessoas a quem você poderá fazer a mesma pergunta e a resposta será bem mais elaborada. Ela poderá dizer: “Eu vejo como a pessoa se mexe, reparo na voz, no cabelo, no sapato, procuro características marcantes ou simplesmente deixo-a falar um pouco de si, e ai identifico-a”.

OCORRE casos de pessoas que passam um bom tempo para reconhecer alguém. Comigo por exemplo: Não consigo memorizar o rosto de todas as pessoas com quem tenho contato; “Quando encontro alguém na rua, levo alguns segundos para identificar a pessoa e as vezes nem consigo”.

MUITA gente tem dificuldades em reconhecer alguém quando chegam e lhe apresentam dizendo: “Lembra de fulano?” e o interrogado fica angustiado, pois, não consegue lembrar-se daquele rosto. Mesmo já tendo se encontrado com ela em diversas ocasiões.

EM outras ocasiões, elas têm por vezes, dificuldades em imaginar como é a cara dos seus conhecidos, inclusive os parentes mais próximos que passam a maior parte do tempo ao seu lado, ou seja: sua família, basta que eles se ausentem por uns dias.

UMA das queixas mais freqüentes é a existência de problemas em acompanhar programas de televisão ou filmes, porque não conseguem seguir a identidade dos personagens.

DESCULPE-ME Caro leitor, mas se você integra esse grupo de indivíduos com dificuldade em reconhecer um rosto; Bem vindo ao mundo misterioso da PROSOPAGNOSIA, uma das deficiências de memorização mais bizarras que existem.

muitas pessoas que não perceberam ser portador desta disfunção até a idade adulta. Em cada portador, ela pode se apresentar de uma forma diferente. Poderemos memorizar muitos rostos e esquecer outros.

EMBORA essa deficiência exista em muitas pessoas, somente foi identificada em 1944, durante a 2ª Guerra Mundial, quando durante um bombardeio russo, um soldado nazista foi ferido e alguns estilhaços de bomba atingiram sua cabeça, causando lesões cerebrais. Ele foi tratado pelo neurologista alemão Dr. Joachim Bodamer, que fez uma cirurgia para remover os estilhaços.

NO dia da alta hospitalar, e para avaliar o estado neurológico do soldado, o neurologista aplicou um teste simples: Convidou a esposa dele para vestir um uniforme de enfermeira e se juntar às enfermeiras de verdade. Aí pergunta a ele: “Percebe algo de diferente nessas mulheres?” O soldado disse que não. Ele simplesmente não reconheceu mais a esposa!

DOUTOR Bodamer fez inúmeros testes no soldado, que revelaram a normalidade de todas as atividades cerebrais, exceto pelo fato de não conseguir mais identificar rostos, mesmo os mais familiares.

DIANTE daquela perturbante constatação, o neurologista deu a esse estranhíssimo sintoma, o nome de PROSOPAGNOSIA: uma associação das palavras gregas prosopo (“rosto”) e agnosia (“desconhecido”).

O Dr. Bodamer não sabia, e só recentemente a ciência descobriu, é que a PROSOPAGNOSIA na maioria das pessoas, é de origem genética. Não precisa necessariamente que tenham sofrido traumatismo craniano, acidentes vasculares ou doenças degenerativas.

PELO que descobri a PROSOPAGNOSIA afeta todos os tipos de pessoas. Muita gente pode ter essa deficiência e ainda não saber . Mas isto não é motivo para se jogar pela janela. Ela só atrapalha nos casos mais fortes, quando realmente destrói a capacidade de identificar rostos, trazendo transtornos para algumas atividades que exijam o reconhecimento facial, aí sim, muda totalmente a vida das pessoas.

OS estudos aprofundados na Alemanha revelaram um número surpreendente de portadores da PROSOPAGNOSIA:

EM 2006, o geneticista alemão Dr. Thomas Grüter, num estudo com 689 voluntários, selecionados de forma aleatória, diagnosticou 17 casos, o que dá uma média 2,5% da amostra. Baseado nesse estudo, concluiu que existem aproximadamente 2 milhões de pessoas com essa deficiência na Alemanha. Estudos revelaram que no Brasil há uns 4,7 milhões de indivíduos portadores dessa anormalidade. Parece um exagero para você? O neurocientista Dr. Brad Duchaine, da Universidade de Londres, chegou a um resultado parecido: de 1600 indivíduos testados, cerca de 2% tinham alguma dificuldade em reconhecer rostos.

DOUTOR Grüter diz que tentar entender a PROSOPAGNOSIA, pode ajudar a medicina a resolver doenças mais sérias, como Alzheimer, pois uma das conseqüências desse mal é justamente a PROSOPAGNOSIA. A diferença é que no portador de Alzheimer, a perda de memória se inicia com a enfermidade e é progressiva.

percebi ser portador desta deficiência, em 1988, quando a minha esposa passou uns tempos em Fortaleza, cuidando de nossas filhas que lá passaram a estudar. Fiquei sozinho no Crato, e todo final de semana ia visitá-las.

UMA vez, passei 15 dias sem vê-las, e para matar a saudade resolvi ocupar minha mente com elas. Ai tive a grande surpresa, percebi que mentalmente não via o seu rosto. Tentei por todos os meios lembrar-me de algum traço facial e não consegui.

AFLITO fiquei, e em nosso primeiro encontro lhe contei o fato, e ela surpreendentemente zombou de mim e me disse que eu queria era preencher a sua ausência com outra. Foram momentos alucinantes, até dramáticos para nós. Ela não acreditava em mim e eu não sabia como explicar. Mas concluímos que isto era um contra tempo que deveria ser resolvido depois.

CONTUDO a partir daí, passei a perceber que não lembrava o rosto de muita gente, inclusive meus clientes. As pessoas que procurei: médicos e amigos, sempre mandavam tomar remédio para a memória e eu não me conformava com essa orientação, pois lembrava tudo, menos os rostos de algumas pessoas.

O fato não me assustou, mas passei a me observar melhor. Aceitei a situação procurando identificar alguém usando certos artifícios, como por exemplo: quando o interlocutor percebia que eu não o reconhecia dizia: Almeida você não está lembrado de mim? – eu exclamava: Não! Mas vá falando que o identificarei. E fazia isto sem vergonha e sem medo. Estava sendo sincero comigo e com ele. E deixei de me preocupar. Afinal de contas esquecer um rosto não era o fim do mundo. Mesmo assim, até hoje, tenho que dar explicações a muita gente do meu convívio para evitar constrangimentos.

APÓS algum tempo, a minha esposa retornou para casa. Encaminhamos domésticas para cuidarem de nossas filhas até a formatura. Mas, descobri que nem mesmo em casa conseguia lembrar seu rosto, quando não está na minha presença, coisa que nunca havia me preocupado nem percebido. E vou continuar sem me preocupar, agora ela sabe que eu não estava inventando.

QUANDO nos queixamos de não reconhecer um amigo ele nos manda tomar remédio para a memória. Mas, especificamente para este caso, ainda não há remédio.

O estudo sobre a PROSOPAGNOSIA é atualmente, ainda muito limitado no Brasil, e por isso há muitas questões que necessitam ser investigadas. Tão poucos médicos conhecem a condição, ou mesmo o termo, que se você for a um consultório e disser que não lembra o rosto das pessoas, o doutor poderá dizer que isto é normal. Algumas pessoas são ruins com números, outras com nomes, e assim vai. – Mas não é bem assim!

A má notícia é que não existe tratamento nem esperança de cura para a PROSOPAGNOSIA num futuro próximo. Neste caso, ao invés de um tratamento a base de medicamentos, procede-se a um treinamento para que o paciente descubra novas formas de reconhecimento de um rosto. A boa notícia é que, tirando os casos mais extremos, as pessoas com esse estranho problema (que não é uma doença), levam vidas relativamente normais.

NO meu caso, não tenho quaisquer dificuldades na minha vida empresarial nem matrimonial. Alguns rostos, memorizo, outros não!

PASSO essas informações adiante por que pode ser útil a alguém. A parte técnica e científica é bem mais elaborada e foge a compreensão da maioria pela infinidade de ilustrações e termos técnicos, deixo, pois com os profissionais da área.

PESQUISANDO o manancial de informações já escrito sobre memória, descobri as origens e o nome da minha deficiência. Assimilei e hoje, convivo muito bem com ela. Afinal de contas ela está em mim, e a mim compete administrá-la sem medo de ser feliz.

27/11/2009

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