Friday, October 1, 2010

Zéca preto e Chico de Zébra


Zeca Preto era um desses clássicos caboclos nordestinos. 1:90m de puro sangue e músculos. A natureza havia lhe conferido uma força privilegiada, o que era reforçado pelo seu trabalho de servente de pedreiro, em que passava o dia carregando latas cheias de concreto para as construções, rendendo-lhe o carinhoso apelido de "Jabobêu" por parte dos colegas. Além daquela cachaça diária no bar do Queléu, onde atualizava as novidades com os amigos, Zeca também adorava paquerar com as pequenas do vilarejo.

Chico de Zébra, ao contrário, era um Cearense, baixinho, bigode aparado, fala fina, metido a valentão, peixeira sempre na cintura, pois era um exímio cortador de cana. Em duas coisas Chico acreditava: em Jesus, e na honra da família. Trajando sua costumeira e surrada bermuda jeans, hoje sem cor, e um chapéu remanescente dos tempos em que largou o trabalho de pescador lá em Camocim, Chico morava numa choupana, com seus 2 filhos pequenos e claro, a sua formosa Antonieta, o seu orgulho. Aos Domingos, iam todos para a missa das 10 horas, quando retiravam do armário a sua roupa mais digna.

Mas há tempos, andava acabrunhado o velho Chico. As más línguas do lugar haviam chegado até os seus ouvidos que Jabobêu estava dando em cima da sua mulher, e embora ele não tivesse qualquer prova da veracidade desses boatos, que a cada dia se agigantavam, isso estava acabando as suas noites de sono. Como medida preventiva, Chico começou a espalhar na redondeza, a fama de ser bom atirador de facas e que iria partir a cara do primeiro que paquerasse com sua amada esposa.

Zeca, folgado como sempre, não se deixava intimidar por esses aparentes ataques de ciúmes, e lá do Bar do Queléu, continuava com aquele olho de urubu esperando a vítima, pra cima da mulher do Chico, até o dia em que, tomando umas cachaças a mais, começou a falar bobagem, e disse pra todo mundo ouvir:

"Antonieta é que é mulher! Ainda vai ser minha, num é pra tá com um bestalhão como aquele Chico de Zébra. Chico além de Fela da Puta, é Corno!" - Foi aquele alvoroço na cidade. A notícia se espalhou como fogo em mato de novembro, até chegar aos ouvidos de Chico, que logicamente, ficou indignado, e passava a noite resmungando, apesar dos muitos chás de camomila que Antonieta lhe preparava. "-- Eu vou matar aquele desgraçado!", dizia. A mulher tentava acalmá-lo: "- Chico, você num vá fazer uma besteira, homem de Deus, olha os teus 2 filhos pequenos pra criar..."

Mas Chico estava se sentindo humilhado e firmemente determinado a passar essa estória a limpo. Espalhou o boato na cidade, de que iria matar Zeca Preto, que quando soube, caiu na gargalhada, não ficando nem um pouco intimidado. Zeca, na verdade, se deliciava com as notícias vindas das bandas do Chico, que garantiu tomar satisfações.

Não suportando mais aquela situação horrível em que quando passava, até as crianças já gritavam: -- Ali vai Chico de Zébra, o corno da cidade!", Chico decidiu que o Sábado à tarde seria a dia ideal para a execução de seu plano macabro. Espalhou na cidade que iria se encontrar com Zeca no bar do Queléu. "-- Quero ver se aquele vagabundo tem a coragem de dizer na minha cara o que ele anda dizendo por aí, nas costas..." dizia.

No dia programado, Chico pegou a sua famosa faca peixeria, botou na cintura, tomou umas bicadas e saiu em direção ao Bar do Queléu. Nem é necessário dizer que metade da cidade o seguiu em polvorosa. Crianças gritavam, mulheres choravam, e os homens naquele alvoroço, diziam: "hoje vai ter pau! hoje um dos dois se acaba ! Eita Diabo!"

Zéca preto tava ainda conversando dentro do bar, quando olhou pela janela e viu a multidão vindo naquela direção, e alguém disse "Que diabo é aquilo, Zéca ? O povo endoidou ? " "Não! deixa estar! É o Chico que vem lavar a honra de corno!"

Chico, já com cara de valentão, "pegando ar", sob a gritaria do imenso público que o seguia, e aparentando uma coragem até então inexistente, mesmo tendo apenas quase metade da altura de Zéca Preto, chegou defronte ao Bar do Queléu e gritou:

"Zéca Preto? Eu quero ver se você é homem é agora!"

Fêz-se aquele silêncio.

"Eu quero é ver se tem homem nessa cidade!"

Zéca, dentro do bar, tomou a última lapada de cana, acendeu um cigarro e foi calmamente em direção à porta. Coçou a cabeça e disse:

"O que é que você quer, Chico ?"
"Eu vim lavar minha honra!" "Eu soube que você andou dizendo por aí que eu sou Corno. Isso é verdade ? Quero ver se você tem coragem de dizer que eu sou corno na minha frente, aqui, pra todo mundo escutar. Quero ver se tu é macho mesmo é agora, Zéca Preto!"

Zéca então, largou o cigarro, ficou na frente do Chico, reclinou o enorme corpo negro, e olhando nos olhos disse com a sua voz grave:

"Eu falei pra todo mundo e digo agora na sua cara, Chico: Você num só é o corno da cidade, mas é também um Fela da Puta! E aquela sua mulhezinha Marieta, ainda vai dar pra mim. Agora abra a boca aí, e diga ao menos um "piu" pra gente se acertar os ponteiro agora! o que é que você veio dizer mesmo ?" ( E começou a dar murros na parede ).

Chico de Zébra, então, tremendo como uma vara verde, quase se mijando diante daquele vexame, com todo mundo olhando e esperando a reação, pensou...pensou e soltou essa:

"Eu num disse ? ... Eu num disse, pessoal ? Taí. Dei valor a você, Zéca Preto! Pra mim homem tem que ser macho assim, que diz as coisa na lata, na cara. Num é como essa ruma de falso, de baitola daqui, que alevanta falso de nóis pelas costa ! Homem pra mim tem que dizê as coisa na cara..." E fechando a boca, saiu cabisbaixo pelo meio da multidão.

Zeca Preto, então, voltou para o bar e continuou a tomar a sua gostosa cachacinha sem ser mais importunado...

Moral da História: Macho é Macho. Corno, sempre será um Corno!

Por: Dihelson Mendonça

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